Como as declarações de bens podem ajudar os eleitores a escolher candidatos
Política
Publicado em 15/09/2024

A declaração de bens é uma das exigências da Justiça Eleitoral para quem deseja concorrer a cargos públicos nas eleições. Os concorrentes precisam informar o patrimônio que possuem em seu nome, como casas, carros, dinheiro, investimentos, ações de empresas e negócios. Em geral, essas informações podem ajudar a acompanhar a evolução patrimonial dos candidatos entre uma eleição e outra. Mas especialistas apontam que os dados podem ajudar de outras formas no processo de cidadania, como a verificação de eventuais interesses dos postulantes em temas específicos.

 

 

O gerente do Centro de Conhecimento Anticorrupção da Transparência Internacional – Brasil, Guilherme France, explicou em entrevista ao NSC Total por que a declaração de bens é necessária e como ela pode ajudar os eleitores na hora de escolher candidatos e acompanhar as decisões dos eleitos. Confira a entrevista abaixo.

 

Por que é fundamental fazer a declaração de patrimônio?

 

As declarações de bens são tradicionalmente compreendidas como importantes instrumentos de prevenção e detecção de casos de corrupção e enriquecimento ilícito. No Brasil, temos três modelos de declaração. Um que as pessoas apresentam à Receita Federal, como parte do Impostos de Renda. É sigilosa, protegida por sigilo tributário. Existe uma declaração entregue em nível administrativo, no caso de parlamentares federais, ao Tribunal de Contas da União (TCU), mas alguns órgãos estaduais também têm mecanismos internos de entrega para a corregedoria ou órgãos de fiscalização interna. Também não são públicas.

 

Por fim, existe a declaração feita por candidatos a cargos eletivos para ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). É a única de agentes políticos que é pública, que permite que a sociedade faça algum tipo de controle social em relação a patrimônio e também ao interesse das pessoas que estão disputando votos. Nesse sentido, elas são instrumentos importantes para haver acompanhamento patrimonial das pessoas envolvidas, a possibilidade de que sejam identificados casos de eventuais incompatibilidades entre os bens declarados.

 

 

 

As declarações também permitem a identificação de eventuais interesses que os agentes públicos tenham em temas diversos. Por exemplo: se um agente público, por exemplo, declara que tem um terreno na faixa da Marinha. A gente vai entender que ele tem um interesse específico quando ele está votando a PEC das Praias, por exemplo, porque seria beneficiado diretamente com a aprovação, que levaria à valorização do seu terreno e de seus bens.

 

As informações patrimoniais também trazem muitos detalhes sobre interesses que os agentes políticos podem ter, de temas sobre os quais eles terão que tomar decisões no exercício do seu cargo. Também são importantes instrumentos para que a sociedade acompanhe se as decisões estão pautadas pelo interesse público, pela visão política e ideológica do político sobre o tema, ou se são pautadas por interesses particulares oriundos dessas características patrimoniais.

 

Essas informações podem ser úteis aos eleitores também antes de escolher os candidatos?

 

Esse é o momento em que os candidatos estão buscando votos e devem de alguma forma apresentar suas declarações. É momento da mudança do poder, da balança. Nesse momento, os candidatos estão buscando eleitores para ganhar seus votos. Se o eleitor, algum meio de imprensa ou uma organização empresarial coloca um questionamento sobre essa declaração de bens, o candidato vai se sentir na obrigação de oferecer algum tipo de esclarecimento sobre isso, então sem dúvida esse é um momento para que os eleitores utilizem essas informações e busquem esclarecimentos sobre questões que possam representar conflito de interesse ou eventuais riscos.

 

Por exemplo, se o eleitor identifica que o candidato nos últimos quatro ou dois anos teve uma evolução patrimonial que parece incompatível com a renda de agente público, pode exigir explicação em relação à evolução patrimonial. Isso não quer dizer que ele não pode fazer isso depois, os dados da Justiça Eleitoral continuam disponíveis, mas o momento da eleição é de colocar essas cobranças e fazer esses questionamentos.

 

As mudanças recentes que reduziram o detalhamento das declarações prejudicou?

 

É preciso fazer uma ressalva: a atual sistemática da Justiça Eleitoral não é perfeita. O nível de detalhamento exigido muitas vezes não permite que haja identificação dos bens, das características desse patrimônio, então o modelo que agente tem atualmente não necessariamente propicia uma avaliação completa ao eleitor, mas já oferece algumas informações e na prática é a única fonte de informação que eleitor vai ter, então já pode ser útil.

 

O que a gente identifica é que infelizmente os dados apresentados não têm o mesmo nível de detalhamento que os dados enviados à Receita Federal. Claro que existem preocupações legítimas em relação ao detalhamento, candidatos não devem informar dados sensíveis como endereços de sua casa, placas dos carros, coisas que podem comprometer sua segurança ou privacidade, mas é possível, sim, oferecer informações suficientemente detalhadas para essas possibilidades de avaliação.

 

O patrimônio dos candidatos pode interferir no equilíbrio das disputas?

 

Existem restrições ao autofinanciamento no sentido de que o candidato não pode financiar [a campanha] para além dos limites dos demais doadores. Nesse sentido, o fato de uma pessoa ter um patrimônio maior que outro não significa imediatamente que essa pessoa vai ter mais condições de promover sua candidatura. Para avaliar essa diferença é importante que o eleitor acesse as informações de doações recebidas.

 

Mas, de toda forma, de fato as informações apresentam um contexto mostrando quais são os interesses econômicos dos candidatos. Se ele tem um terreno em determinado bairro, e a gente está falando este ano de eleições municipais, se tem bens concentrados em determinada localidade e que seriam beneficiados, existe um potencial conflito de interesse que precisa ser considerado. Se a pessoa tem uma empresa de um setor que pode vir a ser beneficiado por um incentivo fiscal. É importante que essas informações sejam consideradas para avaliar.

 

Fonte:NSC

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